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Entrevista: Odebrecht pode ter sócio em construção e até abrir capital, diz Guidolin
DATA: 21/01/2019
Fonte: Aline Bronzati e Cristiane Barbieri, especial para o Broadcast
São Paulo, 18/01/2019 – Antes de ser metralhado por perguntas, Luciano Guidolin, presidente da Odebrecht SA, pede uma pausa. Quer explicar detalhadamente o estado atual do grupo de empresas, que esteve no epicentro Lava Jato – e sofreu as consequências de seus crimes. A missão do engenheiro de produção, formado pela Escola Politécnica da USP e com mestrado em administração como um dos melhores da classe em Harvard, está longe de ser simples. Aos 46 anos, ele está há dois orquestrando um grupo cuja receita caiu de R$ 132 bilhões, em 2015, para R$ 80 bilhões, número esperado para o ano passado. Pior: com um endividamento que caiu um pouco nos últimos meses, mas segue por volta de R$ 70 bilhões.
“É preciso olhar para o filme dos últimos três anos e ver que a Odebrecht passou por um processo de grande transformação e foco dos seus negócios”, diz Guidolin, no encontro que durou mais de duas horas e aconteceu na sede da Odebrecht, em São Paulo. “Vínhamos de um momento no qual aceleramos os investimentos, acreditando nas perspectivas de crescimento do País, quando, em 2016, vivemos a desaceleração da economia, a queda no preço do petróleo que impactou muitos de nossos clientes e as consequências da Lava Jato, com um grande impacto reputacional e de restrição de crédito.”
Sem alternativa, o grupo resolveu colaborar com a Justiça, tanto no Brasil, quanto em outros países. Em 2016, firmaram acordos com Brasil, Suíça e Estados Unidos. Em 2017, foi a vez de outros países da América Latina, onde a Odebrecht também cometeu ilícitos. “Ao mesmo tempo, implementamos a área de conformidade, monitorada pelo departamento de Justiça norte-americano e o Ministério Público Federal”, diz ele.
Com a alavancagem altíssima e restrição ao crédito, a solução foi colocar R$ 12 bilhões de ativos à venda. Dos 15 negócios, sobraram sete. O papel da Odebrecht SA foi redefinido, com a empresa tornando-se uma gestora de negócios e investimentos, onde cada operação é autônoma, independente financeiramente e tem sua própria governança. O conselho profissional foi reforçado e a família saiu também do conselho.
Com o fantasma da recuperação judicial afastado, o ambiente econômico melhorando e apta legalmente a voltar trabalhar, a ideia agora é “começar a planejar um novo futuro”. Para Guidolin, ao final do processo, a Odebrecht será como um grupo empresarial mais enxuto, mas com outro modelo de governança e estrutura de capital ajustada para o tamanho dos negócios. É, inclusive, uma necessidade para cumprir os acordos firmados com os órgãos de controle e o Estado. “Começa-se, aí, um novo ciclo de crescimento”, prevê.
No desenho para 2030 que começa a ser formado no grupo, a Odebrecht não será necessariamente controladora de todos os negócios, inclusive em seu pilar fundamental, a engenharia. Enquanto renegocia dívidas e se programa para vender R$ 5 bilhões, dos R$ 12 bilhões colocados no mercado, a empresa começa a fazer novas obras. Sonha, inclusive, em ter uma governança tão reconhecida que o capital de suas empresas seja aberto e desejado pelos investidores. “Não existe nenhuma razão para que os negócios sejam fechados e 100% controlados pela Odebrecht.” Dizendo-se resiliente e otimista, depois de ter enfrentado um câncer ainda adolescente, entre outros episódios difíceis de sua vida, Guidolin recebeu o Broadcast para a entrevista a seguir:
Broadcast: Quais decisões foram tomadas na reunião de fim de ano, quando o grupo reuniu sua liderança?
Luciano Guidolin: Apresentei as três bandeiras para nosso plano trianual: concluir a reestruturação financeira do grupo, recuperar a imagem e a reputação e construir o futuro. Com o objetivo de, ao longo desse triênio, estar menos na primeira e mais na terceira bandeira. É começar a pensar daqui para frente e construir esse futuro com base nas coisas que a Odebrecht aprendeu e se transformou, do ponto de vista da governança e do compromisso de atuação ética, íntegra e responsável, mas também em todas as boas qualidades que continua tendo de entrega, de compromisso com o projeto, com o cliente, de buscar a inovação, de fazer e empresariar. Temos a Ocyan, cujas sondas estão entre as melhores de todos os fornecedores da Petrobras, competindo com empresas globais. A Braskem é uma empresa petroquímica de classe mundial, globalizada, com fábrica na Alemanha, nos Estados Unidos, no México. Ela está na fronteira de alguns produtos. A Atvos é o segundo maior produtor de etanol do Brasil, um projeto ousado que pegou um momento muito difícil do setor. São qualidades que a gente desenvolveu ao longo desses anos.
Broadcast: Como está a estratégia para a venda de ativos?
Guidolin: Dos R$ 12 bilhões, a gente realizou R$ 7,5 bilhões e tem ainda R$ 5 bilhões em andamento. Tem uma parte importante do Peru, a hidrelétrica de Chaglla, um ativo de US$ 1,4 bilhão, vendido para um investidor para chinês, a Três Gargantas, desde 2017. A finalização da venda dependia do nosso acordo de leniência no Peru, que concluímos com sucesso no fim do ano. Temos ainda a participação na concessionária Rutas de Lima e alguns ativos de infraestrutura menores. Vendemos também uma participação em energia e, em Angola, uma fábrica de mineração de diamante, além do projeto de PPP Inova BH, uma PPP de escolas vendida para um investidor privado.
Broadcast: E Braskem?
Guidolin: A Odebrecht sempre acreditou na petroquímica. Quando o grupo enfrentou dificuldades, era comum ouvir que era precisava desmobilizar a Braskem. Mas tínhamos uma visão muito clara de que a empresa não tinha seu valor reconhecido. Foi que aconteceu: ela mais que triplicou de valor nos últimos três anos. Hoje, temos endereçado um negócio com uma lógica estratégica muito forte, que é a combinação dos ativos da Braskem, com os ativos da LyondellBasell. É uma empresa com sede na Holanda, global, maior do que a Braskem, com uma sinergia e uma complementaridade muito grande em termos de produto e localização. Há a oportunidade de continuar como investidor no setor petroquímico, como parte de um grupo empresarial maior. É a lógica do que vai ser o grupo Odebrecht para frente: uma empresa com alguns negócios que ela opera e controla e outros investimentos nos quais ela participa, contribui na governança e como acionistas, sem o controle.
Broadcast: Quando a negociação com a Lyondell deve ser concluída?
Guidolin: Anunciamos que o processo de due dilligence começou no segundo trimestre do ano passado e essa fase está praticamente concluída. Agora, estamos em uma etapa de negociação e de conversas bilaterais entre as partes.
Broadcast: A Odebrecht vai ser acionista minoritária?
Guidolin: A intenção da Odebrecht é continuar como acionista da área petroquímica, nesse conjunto de empresa, trocando ações da Odebrecht por ações da empresa combinada.
Broadcast: A Petrobras concorda com isso?
Guidolin: No acordo de acionistas com a Odebrecht, ela tem a opção de exercer o tag along com a Odebrecht, bem como o mercado de capitais como um todo.
Broadcast: Qual é o maior desafio financeiro da Odebrecht hoje? A Atvos?
Guidolin: Do ponto de vista de volume, tem a reestruturação dos bonds internacionais garantidos pela engenharia e construção, um processo que se iniciou em novembro e que visa ter uma dívida num perfil e numa característica adequada à realidade presente e à curva de crescimento da engenharia. O volume do endividamento e seu perfil não eram compatíveis com a característica do negócio naquele momento e, por conta disso, estavam sendo negociados com grandes descontos no mercado internacional. A outra discussão que está correndo é da Atvos, que também tem uma dívida com um montante e um perfil, que, apesar do grande crescimento do resultado operacional da empresa e de a Odebrecht ter aportado quase US$ 2 bilhões de capital do acionista no negócio, ainda tem questões relacionadas a financiamento de capital de giro, estrutura e características da dívida que precisam ser equacionadas. Mas são dois negócios que têm oportunidade de crescimento. A Atvos (tem oportunidade) de ocupar a capacidade plena das usinas de moagem e trazer um aumento importante da geração de caixa e a construtora, que teve redução da sua atividade por conta do número de projetos de infraestrutura e tem também a oportunidade de crescer. São os dois processos que, do ponto de vista de dimensão, são mais significativos.
Broadcast: Os senhores pensam em vender a Atvos?
Guidolin: Hoje, vemos uma melhoria muito importante da qualidade e do resultado operacional da Atvos, mas o mercado não reconheceu as oportunidades no setor de açúcar e etanol. A prioridade na Atvos é adequar seu endividamento, completar o investimento para o uso da capacidade máxima e buscar sócios e parceiros. Dentro do nosso direcionamento estratégico, não vemos no futuro a Odebrecht com 100% de todos esses ativos. A Odebrecht hoje tem 100% da Atvos por uma conjuntura. Ela tinha 55% e os outros 45% eram de fundos nacionais, internacionais e BNDESPar. No momento em que a Atvos precisou de aporte de capital, a Odebrecht entrou com os recursos sozinha e se tornou controladora integral. Agora, a participação da Odebrecht na Atvos vai depender das oportunidades que vierem através de sócios estratégicos ou de uma futura abertura de capital, depois que o endividamento estiver estruturado e o investimento operacional estiver completado.
Broadcast: Como os senhores vão fazer essa reestruturação da dívida da Atvos?
Guidolin: No diálogo com os credores. A conversa foi iniciada no ano passado e vai ser intensificada a partir desse primeiro trimestre.
Broadcast: Quais ou outros desafios financeiros?
Guidolin: Temos buscado as áreas que necessitam de uma solução estruturante e os credores, junto conosco, têm entendido o processo e apoiado a Odebrecht. A gente completou em 2017 a reestruturação da Ocyan. Tivemos recursos em 2018 para quitar nossos compromissos com o Ministério Público Federal, com multas, com a operação da companhia e outros credores. O diálogo continua.
Broadcast: Houve resistência dos bancos?
Guidolin: Tivemos apoio e o entendimento que o trabalho de desalavancagem e o foco em negócios principais eram necessários e precisavam ser feitos.
Broadcast: Os srs. precisam de mais dinheiro novo esse ano?
Guidolin: Depende da velocidade do programa de desinvestimentos, mas temos o diálogo com os credores para que a gente possa implementar esse processo e achar soluções estruturantes para os ativos.
Broadcast: O desinvestimento de R$ 5 bilhões será feito este ano?
Guidollin: Sim. Chagllia deve ser no primeiro trimestre e Santo Antônio, ao longo do ano, também com um investidor chinês.
Broadcast: Em que pé que está o diálogo com os credores dos bônus internacionais da construtora?
Guidolin: O diálogo com os credores por meio de seus assessores financeiros começou no início de dezembro, está acontecendo e tem um cronograma estabelecido entre as partes para essa discussão. Vai terminar quando chegarmos em um acordo.
Broadcast: Essas propostas já foram feitas?
Guidolin: Ainda não. É um processo que toma vários meses, mas é um interesse da companhia concluir esse processo o mais cedo que for possível.
Broadcast: Qual é a Odebrecht 2030?
Guidolin: O desenho ainda não está pronto, mas certamente terá core importante em engenharia, acreditando na retomada dos investimentos em infraestrutura, na capacidade técnica instalada e na lição de casa que fizemos internamente. Haverá espaço no Brasil e em outros países para crescimento de uma empresa de engenharia que atue de forma ética, íntegra e transparente. Essa é a nossa crença. Podemos ter outros negócios e outras participações. Em se concretizando essa discussão com Lyondell, investimentos em petroquímica. Hoje temos negócios e controle em etanol e açúcar, óleo e gás, infraestrutura e imobiliário. Desse conjunto, alguns manteremos como negócios e outros teremos participações, mas esse desenho ainda não está definido.
Broadcast: Há espaço para uma empresa de engenharia que atua de forma ética, íntegra e transparente, mas a Odebrecht vai conseguir ter essa imagem?
Guidolin: De um lado, tivemos uma exposição de imagem que é resultado da nossa colaboração, de coisas que aconteceram de quatro, cinco anos a dez anos atrás. Por outro lado, a gente vai ter capacidade de demonstrar que a Odebrecht é a empresa mais segura para se contratar, que não só aprendeu com seus erros, como é monitorada tanto pelo Brasil, quanto pelos Estados Unidos e entende seu compromisso com essa postura. Em paralelo a isso, mesmo durante esse período difícil para companhia, a Odebrecht não deixou de entregar e completar seus projetos. Buscou recursos e competência. Ao mesmo tempo em que ela não conseguia financiamento de longo prazo para o Galeão, o aeroporto estava pronto para a Olimpíada acontecer. Serão nossas ações concretas ao longo do tempo.
Broadcast: Haverá alguma campanha de comunicação para reforçar esse processo?
Guidolin: Algumas das nossas empresas mudaram marcas, mas achamos que qualquer mudança, ao longo desses três anos, teria sido classificada como estética. Fizemos ações concretas e estamos caminhando com essa visão de futuro. Podemos vir a discutir com entrada de novo sócio uma mudança, talvez não do nome, mas apresentação da marca. Quisemos primeiro implementar as mudanças.
Broadcast: Vai ter um novo sócio na construtora?
Guidolin: No futuro, a gente não descarta ter sócios na construtora e nem, num momento futuro, abrir o capital da construtora.
Broadcast: Mas já está sendo negociado?
Guidolin: Não. Ao mesmo tempo em que olhamos os desafios do presente, a gente não pode deixar de pensar para onde a gente estava caminhando. Na construtora, já tivemos algumas discussões de modelos de parceria que podem ser geográfica, por especialidade ou no todo. Há ainda uma visão do grupo que o modelo de governança que temos pode ser um fator de vantagem e o mercado de capitais é uma uma via de dar liquidez às ações e valorização do patrimônio. Isso é uma verdade para todos os nossos negócios. Não existe nenhuma razão para que os negócios sejam empresas fechadas e 100% controladas pela Odebrecht.
Broadcast: A Odebrecht está habilitada para participar dessa retomada no País nas obras públicas?
Guidolin: Sim, do ponto de vista formal, estamos plenamente habilitados. Fomos a primeira empresa que fez acordo formal com o Ministério Público Federal, com a Advocacia-Geral da União, Controladoria Geral da União e o Conselho Administrativo Defesa Econômica. Fizemos acordos com várias autoridades, que têm várias competências nesses três anos. Temos competência técnica e agora vamos buscar apresentar as melhores soluções e projetos. Já estamos fazendo uma termoelétrica para Furnas, o BRT de Belém, uma segunda etapa do metrô do Panamá, duas obras nos Estados Unidos. Discutimos voltar a contratar obras importantes no Peru e nos países onde a gente teve uma exposição de imagem muito intensa, ao longo processo.
Broadcast: Como o senhor recebeu a notícia publicada em O Estado de S.Paulo sobre a anulação de parte do acordo com o Ministério Público de São Paulo?
Guidolin: Estamos seguros e confiantes dos acordos feitos com a Justiça, sob as leis e exigências vigentes. Temos o objetivo de fazer a colaboração em todos os âmbitos
Broadcast: A maneira como a Lava Jato foi conduzida minou a saúde financeira das empresas, que não deveriam pagar pelos erros dos executivos e das pessoas envolvidas?
Guidolin: Nunca senti no Brasil a vontade de matar a empresa.
Broadcast: E a Odebrecht Transport?
Guidolin: A OTP desmobilizou alguns de ativos, como Galeão, Embraport e Logum. Vai fazer desmobilizações adicionais. A Rota das Bandeiras está em discussão com um investidor, bem como dos ativos do Rio de Janeiro de mobilidade urbana. Outro grande projeto é a rota do Oeste, que é a concessão da BR-163, canal de escoamento agrícola do Centro-Oeste. Com a queda econômica das concessionárias, ele precisa ser reendereçado, com o reescalonamento dos investimentos ou uma solução de devolução e restituição dos investimentos já feitos. O interesse da OTP é retomar o projeto. São programas que estão sendo desenvolvidos pela OTP porque a empresa tem a sua estrutura financeira própria e sócios. A expectativa de conclusão é ao longo do primeiro semestre deste ano.
Broadcast: O senhor acha que a Odebrecht já tem a sua cara?
Guidolin: A Odebrecht sempre teve a cara de um grupo muito grande de pessoas. Uma empresa que atua em tantos países e negócios tem uma cara em cada área como etanol, engenharia, petroquímica. A Odebrecht não é uma empresa com uma cara única. Em comum, tem uma cultura forte na delegação, confiança, acreditar na capacidade de pessoas e que está também sendo complementada e fortalecida nos processos de governança, políticas e práticas de controle e gestão. O objetivo é fortalecer o negócio, não personificar.
Broadcast: É difícil lidar com tantos perfis diferentes?
Guidolin: Para mim, é um grande aprendizado. Tenho 46 anos e faço dois anos à frente da Odebrecht em maio. Na Odebrecht hoje ao mesmo tempo que temos executivos com muita experiência com 50 ou 60 anos de idade e 20 ou 30 anos de experiência, há jovens que assumiram posições de forma acelerada. É um processo saudável. A Odebrecht sempre teve um foco grande em formar pessoas. Isso permitiu sair de um processo que traria um desgaste para qualquer organização e exigiria uma série de mudanças de lideranças de uma vez só em vários âmbitos e que foi possível porque tinham pessoas que estavam sendo preparadas. Dois anos depois, já conhecem seus negócios e começamos a pensar como formar as novas gerações.
Broadcast: Os desafios pessoais que o senhor teve ao longo da vida ajudaram a construir sua resiliência, o jogo de cintura para coordenar um processo difícil desse?
Guidolin: Resiliência, otimismo e determinação são características tem você que ter hoje no grupo de liderança da Odebrecht. Cada um tira das suas experiências pessoais, mas eu acho que nada para ninguém veio fácil.
Broadcast: Qual foi seu maior desafio nesses dois anos de Odebrecht?
Guidolin: Concluir uma etapa que nos permita cada vez mais olhar para frente. É um processo. Não é como um livro que você chega na última página. Nosso grande objetivo é concluir toda a lição de casa, solucionar as questões estruturantes financeiras e aí partir de uma base equacionada, de olhar para frente. Esse é o grande desafio de 2019.
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